Bate tudo certo. O Presidente da República chamou hoje António Costa (não lhe restava outra solução, como escrevi anteontem: Sapo Costaco). Mas sem dar o braço a torcer (como antecipei em Governo até Março, e O Milagre das Rosas). O atual presidente deste Portugal adormecido chamou o líder do Partido Socialista, não para o convidar formalmente para Primeiro-ministro, mas sim para “desenvolver esforços tendo em vista apresentar uma solução governativa estável, duradoura e credível”. Ou seja, entregou-lhe um caderno de encargos.
Mais propriamente, estabeleceu como pressuposto desse convite a “clarificação formal de questões que, estando omissas nos documentos, distintos e assimétricos, subscritos entre o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista Português e o Partido Ecologista “Os Verdes”, suscitam dúvidas quanto à estabilidade e à durabilidade de um governo minoritário do Partido Socialista, no horizonte temporal da legislatura”.
São seis, essas questões/condições: “a) aprovação de moções de confiança; b) aprovação dos Orçamentos do Estado, em particular o Orçamento para 2016; c) cumprimento das regras de disciplina orçamental aplicadas a todos os países da Zona Euro e subscritas pelo Estado Português, nomeadamente as que resultam do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do Tratado Orçamental, do Mecanismo Europeu de Estabilidade e da participação de Portugal na União Económica e Monetária e na União Bancária; d) respeito pelos compromissos internacionais de Portugal no âmbito das organizações de defesa colectiva; e) papel do Conselho Permanente de Concertação Social, dada a relevância do seu contributo para a coesão social e o desenvolvimento do País; f) estabilidade do sistema financeiro, dado o seu papel fulcral no financiamento da economia portuguesa”(cito do “documento entregue ao Secretário-Geral do Partido Socialista” publicado hoje em www.presidencia.pt).
Parecem-me condições razoáveis e consonantes com o carácter, repúdio pela solução e sentido histórico-político do atual Presidente da República, que é quem tem o poder que lhe deriva da competência constitucional. Trata-se, de resto, de condições que se enquadram nos poderes constitucionais do Presidente da República, em especial no disposto no art. 133º, al.f) da Constituição.
E são garantias que o Partido Socialista pode e deve dar formalmente. Se os comunistas (incluindo marxistas, trotskistas e maoistas) as darão ou não, a ver vamos. Encontro margem para negociação nas expressões “clarificação formal” e “em particular o Orçamento para 2016”, constantes do documento. A aprovação do Programa de Governo e do Orçamento de Estado para 2016 são, naturalmente, condição sine qua non para se poder afirmar que há acordo à esquerda na Assembleia da República.
O Presidente da República Cavaco Silva vai terminar por convidar António Costa para Primeiro-ministro. Mas não dá o braço a torcer. Bate tudo certo.
Luis Miguel Novais
Riqueza, civilização e prosperidade nacional