Riqueza, civilização e prosperidade nacional

quinta-feira, 11 de junho de 2015

E a dívida da Tap?

É oficial, o Governo deste Portugal adormecido deliberou privatizar 61% do capital social da Tap - Transportes Aéreos Portugueses. O que me suscita, desde já, ainda sem conhecer os detalhes da venda (que ainda não foram revelados), três notas: uma negativa, outra positiva e um grande ponto de interrogação.

1. A nota negativa vai para o facto de o Governo não ter conseguido atrair para a Tap um parceiro dos grandes da Star Alliance, em especial a United, a Air China ou a Lufthansa.

2. A nota positiva vai para o facto de o consórcio comprador, liderado por David Neeleman, apresentar experiência e vocação transatlântica, além de surgir integrado pelo grupo português Barraqueiro.

3. O enorme ponto de interrogação vai para o preço da transacção: os 61% da Tap são vendidos por cerca de 400 milhões de euros? Ou por esse valor em cash mais a assunção irrestrita pelo comprador dos cerca de 600 milhões de euros de dívida da Tap correspondentes aos 61% ? No primeiro caso, trata-se de um negócio ruinoso; no segundo caso, trata-se de um negócio razoável em termos de preço (a venda de 61% por cerca de 1.000 milhões valoriza a Tap em cerca de 1.600 milhões, em linha com a valorização da Aer Lingus).

O reconhecimento da "coragem do Governo", imediatamente reclamada pelo primeiro-ministro, depende, afinal, da resposta a esta questão: quem fica com os 61% dos cerca de 1.000 milhões de dívida da Tap? Nós, ou o comprador? Se somos nós, não é coragem, é grave.

Luis Miguel Novais


Post scriptum: no Jornal das 8 da TVI, pelas 20h10 deste mesmo dia 11 de junho, o ministro da Economia acaba de afirmar que a dívida passa inteiramente para o balanço da Tap, o que significa (na prática) que passa em 61% para o comprador - e, conforme é razoável supor, liberta-nos de responsabilidades e garantias dadas a terceiros sobre este valor. O que é uma boa notícia e me põe de acordo com esta operação de privatização, afinal em bom preço e, ainda por cima, liderada por um português: Humberto Pedrosa, dono do grupo Barraqueiro, investe afinal a título pessoal e tem a maioria no consórcio comprador, o que muito me apraz. Lamento apenas o modo como o Governo mal comunicou de início até uma operação boa, considerando o preço e o comprador possível.

Luis Miguel Novais


Post-post-scriptum: acabo de ver novamente o ministro da Economia deste Portugal adormecido, agora na TVI24, pelas 21h30 deste dia 11 de junho, e afinal, ao contrário do que atrás afirmei ser razoável supor, a resposta sobre a assunção da dívida da Tap pelo comprador foi evitada: permanece, por isso, a dúvida legítima sobre o bom ou mau preço para a venda da Tap: repito que me parece que se os 61% são vendidos por cerca de 400 milhões de euros é grave; já se são vendidos por cerca de 1.000 milhões de euros é aceitável. A diferença permanece nos cerca de 600 milhões de euros de dívidas da Tap hoje garantidas pelo Estado e que amanhã terão necessariamente de ser assumidas perante terceiros pelo comprador. Se não o forem, é o próprio Governo quem se desdiz e perde a face, tornando impossível uma privatização perdulária em função do preço (basta recordar que há bem pouco tempo os CTT renderam 910 milhões de euros em Bolsa).

Luis Miguel Novais