A propaganda do Governo deste Portugal adormecido não pára de me surpreender: numa visita de ontem aos agora subconcessionados Estaleiros Navais de Viana do Castelo, o primeiro-ministro afirmou que valeu a pena tomar a decisão de extinguir a empresa pública, porque a privada subconcessionária West Sea está em actividade. Sucede, porém, que devemos manter a honestidade em assuntos de Estado.
E manda a honestidade que se diga que a subconcessionária West Sea se ocupou neste ano a reparar navios que já eram clientes da empresa extinta, com empregados da mesma - e que, portanto, esta também podia ter reparado.
A West Sea não construiu nenhum novo navio nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
Sendo as actividades da construção naval, de um lado, e da reparação naval, do outro, claramente distintas - com equipas e volumes de negócios diferentes, números mais pequenos no caso da reparação naval, embora mais constantes porque associados ao lugar, à rota dos navios a reparar, e daí a clientela habitual de reparação em Viana do Castelo, pela qualidade do seu trabalho de há muitos anos a esta parte, e não por ser agora a West Sea quem repara os navios - sem desprimor para esta neófita (em actividade há um ano).
Segundo a propaganda do Governo, a West Sea poderá vir a construir dois navios patrulha para a nossa Armada; o que a empresa extinta, como é evidente, também poderia ter feito, e fez: construiu dois destes recentemente, o NRP Figueira da Foz e o NRP Viana do Castelo, que estão no mar a bem navegar.
Ora, sendo o cliente... o próprio Estado... E pagando 77 milhões de euros para construir o novo par de navios patrulha, conforme anunciou... Estamos perante a bizarra (é o menos que se me ocorre dizer, na presente circunstância) situação de o Estado ter acabado com uma sua própria empresa para entregar a sua própria encomenda a uma empresa privada que opera no mesmo lugar.
Não vislumbro, por conseguinte, a vantagem da extinção.
O que vem escondido pela propaganda da vantagem é o inconveniente, que convém trazer à colação (e a comunicação social omite, certamente por desconhecimento): a extinção da empresa pública custou aos contribuintes portugueses, só no ano passado, 264 milhões de euros (são dados do Parlamento, da UTAO - Unidade Técnica de Acompanhamento do Orçamento de Estado, publicados em Janeiro de 2015), que foram acrescentados à dívida pública por meio de transferência via Empordef, ex-empresa holding da extinta Estaleiros de Viana do Castelo.
Encerrar esta empresa pública de Viana do Castelo custou, portanto, só em 2014, mais de 264 milhões de euros. Foi mais porque convém acrescentar, por exemplo, o entretanto gasto pelo mesmo Estado em subsídios de desemprego dos mais de 400 empregados da empresa pública não reintegrados pela West Sea.
É este o inconveniente que, na minha opinião, arrasa a vantagem anunciada pelo primeiro-ministro: com o dinheiro gasto pelo Governo no encerramento da empresa pública, ficámos sem mais de 264 milhões de euros e mais 400 desempregados.
Ou seja, por exemplo, ficámos com seis navios patrulha a menos nas nossas águas territoriais (264 milhões a dividir por 38,5 milhões cada navio... e ainda sobrava quase que para mais um).
Com este desperdício do Governo ficámos, como diz o nosso povo, a ver navios.
Luis Miguel Novais
Riqueza, civilização e prosperidade nacional