Riqueza, civilização e prosperidade nacional

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

O Conselheiro dos Açores

Mão amiga fez-me chegar uma entrevista recente do Juiz Conselheiro Araújo de Barros, pessoa viva e íntegra que muito admiro, há mais de três décadas. Merece partilha e comentário neste dia em que, a justo título, celebramos a nossa independência.

Neste Portugal adormecido adjetivamos como "Desembargadores" os juízes dos tribunais de segunda instância, e como "Conselheiros" os juízes dos tribunais superiores. O Juiz Conselheiro Araújo de Barros integra atualmente o Tribunal de Contas. Poder-se-ia dizer que preside a Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas, não fosse a circunstância de ser o único. Na realidade, neste país ainda indevidamente centralizado, mesmo na Região Autónoma dos Açores apenas existe um Juiz Conselheiro. E nenhum outro tribunal superior ou de segunda instância.

Os apelos e outros agravos judiciais açorianos vão todos parar a Lisboa. O que leva a circunstâncias absurdas, como a que resulta da dita entrevista, publicada no dia 21 de novembro de 2021, no jornal Correio dos Açores:

- Jornalista Carla Dias: "Que dificuldades encontra nos Açores, enquanto profissional em relação ao «centro de decisão» da Justiça (Lisboa)?"

- Juiz Conselheiro Araújo de Barros: "Lisboa «centro da decisão da Justiça»?! Estará seguramente a falar do que é veiculado pelo "centro da decisão da comunicação social". Pelas três televisões com sinal aberto, todas com sede em Lisboa. Ou pelos outros órgãos de comunicação social, cuja ampla difusão sistematicamente ofusca o que se vai passando por este país fora. Fazendo questão de nos encharcar a todos com o que se passa por aquelas bandas. Como se Portugal começasse a norte em Sintra e terminasse a sul em Setúbal. Esquecem-se que mesmo que chova em Lisboa, pode ser que faça sol noutras paragens. Depois chegamos à triste e irónica conclusão de que os portugueses mais ignorantes e provincianos acabam por ser aqueles que andam lá por Lisboa. Dou um exemplo quase anedótico: numa decisão de três juízes do Tribunal da Relação de Lisboa, relativa a um recurso de um processo dos Açores em que se julgava um embate entre dois veículos num cruzamento, foi agravada a culpa de um dos condutores porque o veículo que conduzia seguia numa simples (!?) estrada regional. Os senhores desembargadores ignoravam (e tampouco tiveram a sagacidade de entrever) que não haveria cá estradas nacionais e que as estradas regionais são precisamente as «nossas estradas nacionais». O que os levou a decidir ao contrário do que deviam".

Acrescento eu que não é só em Lisboa que há juízes ignorantes, dependentes (inclusivé da Maçonaria, que continua a ter indevida mão invisível nos nossos tribunais), e parciais (os conúbios com seguradoras, então, roçam o escândalo quando os juízes se mostram cegos aos factos que resultam do processo, felizmente escrito e público). Mas é bom saber que, pelo menos nos Açores, há um Juiz Conselheiro sabedor, independente e imparcial. Como se deve e deseja que todos sejam.

Com o estado em que se encontra a Justiça, este Portugal adormecido teria muita sorte se o próximo primeiro-ministro (seja ele Rio ou Costa, que os juízes não têm partidos) chamasse para Ministro da Justiça o Conselheiro dos Açores. Estou certo de que os resultados estariam, pelo menos, ao nível dos do Almirante das Vacinas.

Luis Miguel Novais