"Onde estavas no 25 de abril de 1974"? Estava na escola. Na então Escola Secundária de Augusto Gil, entre as ruas de Santa Catarina e da Alegria, no Porto deste Portugal adormecido.
Na manhã do dia 26 de abril de 1974, tinha então dez anos de idade, fui para a escola, normalmente, de autocarro, e apenas lá chegado, e já em sala de aula, mandaram-nos (a todos os alunos) para casa, porque em Lisboa tinha havido uma revolução.
Costumo dizer que nasci no lado errado dessa revolução.
Isso é verdade do ponto de vista económico. Porque ambas as minhas famílias eram detentoras de vastas propriedades associadas a empresas que beneficiavam do condicionamento industrial, e até do apoio expresso do anterior regime. Mas já ultrapassámos isso: "vão-se os anéis, ficam os dedos".
Não obstante, beneficiei, ainda beneficio, do regime saído da Revolução de Abril, em cujos três D (de democratização, descolonização e desenvolvimento) me revejo, participei e participo. Por opção, por convicção, com gosto. Dou o meu melhor, faço o que posso. Acredito mesmo que a Liberdade em Segurança, a Democracia Multipartidária e o Estado Direito (não é gralha) valem as penas (que são muitas, quotidianas). Pela Paz.
A maioria dos Portugueses de hoje não recordam, nem viveram, a descolonização. Alguns, por sermos então ainda jovens; outros ainda nem nascidos; a grande maioria por não sermos retornados; a imensa maioria por não termos pegado em armas nos três palcos de guerra colonial: Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Muitos, demasiados, fizeram-no, porém; viveram a guerra, alguns em combate.
Segundo uma fonte credível, como é a História Militar de Portugal (de Nuno Severiano Teixeira, Francisco Contente Domingues, João Gouveia Monteiro, A Esfera dos Livros, 2017): "Suspenderam-se praticamente todos os compromissos com a NATO e a política de defesa dirigiu todos os esforços para a luta anti-guerrilha... O esforço de guerra em África... implicou um aumento brutal dos efetivos, o que obrigou ao recrutamento e à mobilização em massa de milicianos" (aut.cit., op. cit., pg.541).
Não fora a Revolução de Abril, e à minha geração teria cabido a má sorte da anterior, que combateu em África durante treze anos, entre 1961 e 1974. Cerca de 100.000 Portugueses, em média, por ano, durante treze anos (aut. cit., op. cit, pgs. 553, 556, 561). Alguns ainda estão vivos, demasiados morreram. À Revolução de Abril devemos a descolonização, que nos trouxe paz nos últimos 50 anos.
Agora que está para acabar o "guarda-chuva" da NATO (sob o qual vivemos nestes últimos 50 anos), e para recomeçar a corrida ao rearmamento europeu (de que a visita de hoje do presidente de França, Emanuel Macron, é vestibular), convém recordá-lo.
Luis Miguel Novais