Riqueza, civilização e prosperidade nacional

segunda-feira, 28 de maio de 2018

Médicos que matam

Entre "A Riqueza das Nações", de Adam Smith, e "A Riqueza e a Pobreza das Nações", de David Landes, ocorreu um grande progresso civilizacional: a higiene humana, traduzida em água canalizada nas nossas casas e esterilização generalizada na medicina, que, conjuntamente com um Sistema Nacional de Saúde, prolongam a vida humana. David Landes ilustra-o com uma anedota impressionante: o homem mais rico do mundo no tempo de Adam Smith morreu devido à infecção resultante da faca, não esterilizada, que o operou; de nada lhe valeu todo o seu dinheiro.

A questão é de actualidade neste Portugal adormecido, onde se discute, esta semana, a chamada despenalização da eutanásia. Trata-se de um eufemismo para introduzir nas causas de exclusão da ilicitude o homícido por médico, com consentimento do suicida. Parece-me um exercício de maus juristas: a questão poderá e deverá colocar-se entre as causas de exclusão da culpa do médico (por definição, os médicos não se dedicam a matar), nunca entre as causas de exclusão de ilicitude de um homicídio (que é aquilo que é um suicídio medicamente assistido - de resto, se assim não fosse, não haveria que discutir a despenalização da eutanásia).

Nesta matéria, concordo com a posição publicamente assumida pelo ex-Presidente da República Ramalho Eanes: insira-se o consentimento (ou falta do mesmo) no testamento vital, que é onde ele pertence. Evite-se, assim, o cheque em branco aos médicos que seria a despenalização da eutanásia (conferindo-lhes o absurdo direito de matar), mantendo-se o (moralmente, mas não juridicamente, censurável) direito de cada um dispor da sua própria vida - fronteira de todos os direitos, na morte inexistentes.

Luis Miguel Novais