A nomeação de Carlos Moedas para comissário europeu em representação de Portugal sabe a prémio de consolação para Durão Barroso e Passos Coelho, visivelmente de sorrisos amarelos nos lábios. E deixa-nos, aos portugueses que eles deveriam defender convenientemente, com um travo amargo na boca.
Não pode saber a mais: a pasta da "Investigação, Inovação e Ciência" agora entregue ao ex-Secretário de Estado Adjunto do Governo de Portugal resume-se a uma mera secretaria de estado europeia; na nova orgânica ("nova maneira de trabalhar") da Comissão Europeia, esta pasta não corresponde sequer a um ministério, porquanto depende organicamente de uma "ministra" (a agora vice-presidente Alenka Bratusek, actual primeira-ministra eslovena, uma dos sete novos vice-presidentes).
Os 81 mil milhões que o nosso comissário secretário de Estado vai gerir, segundo afirma a propaganda amarela, enquadrar-se-ão no quadro orçamental plurianual (ainda necessarimente incompleto) de dois serviços que o novo comissário-secretário irá tutelar: (i) o Directorate-General for Research and Innovation (RTD), cuja missão vem expressa no relevante site: "to develop and implement the European research and innovation policy with a view to achieving the goals of Europe 2020 and the Innovation Union"; (ii) "The relevant parts of the European Research Council executive agency (ERCEA)", as quais partes relevantes hão-de ser delimitadas com diversos comissários-ministros, alguns vice-presidentes da Comissão, uma vez que a missão da ERCEA é "to encourage the highest quality research in Europe through competitive funding and to support investigator-driven frontier research"; olhando para o quadro geral dos outros comissários, por exemplo, da Economia Digital, da Acção para o Clima e a Energia, Ambiente, Assuntos do Mar e Pescas, Transportes e Espaço,não será difícil de adivinhar uma "batalha das bolsas", sobre a definição concreta de quem manda nestas partes relevantes, de que o nosso comissário ficará com uma fatia (e não com o bolo, ao contrário do que afirma a propaganda).
Que seja uma secretaria de Estado da Inovação o que toca a Portugal na nova Comissão Europeia, não deixa de ser irónico, porque no Governo actual assim sucede: a pasta da Secretaria de Estado da Inovação está (bem) entregue a Pedro Gonçalves, Secretário de Estado que depende do Ministro da Economia. Pedro Passos Coelho é pago com a mesma moeda.
Agora, sobre o que interessa mesmo a este Portugal adormecido, segundo me parece, trata-se de uma pasta em vias de extinção. A isso levará o actual debate académico-empresarial sobre o conceito de Inovação. Derivado da "destruição criativa" de Schumpeter (tão do agrado do nosso ex-ministro Victor Gaspar), para a "inovação disruptiva" de Christensen, o conceito acaba de disromper-se (por assim dizer), com o debate lançado este Verão por Jill Lepore, por meio do seu ensaio intitulado "The Disruption Machine" (de leitura obrigatória, publicado na New Yorker e consultável online).
Na realidade, Inovação foi o que acabaram de fazer os U2, esta semana, com o lançamento do seu novo disco conjuntamente com o anúncio do novo iphone: perante a extinção do modelo de negócio discográfico tal como o conheceramos até ao advento do digital e downloads grátis, que acantonou os músicos às receitas dos concertos, os U2 acabam de oferecer o disco a todos os titulares de contas nas lojas da Apple (está lá, já descarreguei o meu); claro que aquele ofereceram terá de ser pago por alguém; não me parece nada que passe pelo nosso Moedas e a sua nova secretaria."Songs of innocence".
Luis Miguel Novais
Riqueza, civilização e prosperidade nacional