"Como um tolo no meio da ponte" é expressão frequentemente utilizada neste Portugal adormecido. Deve ser como se deve estar a sentir, passada a euforia inicial, o ex-primeiro-ministro de Portugal José Sócrates, a propósito da decisão judicial sobre ele proferida ontem no Tribunal Central de Instrução Criminal.
Como é próprio da minha deontologia profissional como advogado, não me vou pronunciar sobre o trabalho dos meus colegas de profissão, nem sobre o trabalho do Ministério Público - de resto, nem poderia, porque não tenho tempo, nem vontade, para ler os milhares de páginas do processo judicial para poder fazer uma exegese crítica fundada.
Posso, porém, dizer o que me parece que ouvi como cidadão sobre a decisão judicial. Deixando a seguinte declaração bem expressa: sou muito crítico de José Sócrates, o péssimo primeiro-ministro que nos governou entre 2005 e 2011, tendo-nos legado um buraco de dívida em forma de resgate de 78 mil milhões de euros (comparar com a "bazuca" atual de 16 mil milhões de euros).
Esta minha opinião política, não me impede, porém, de pugnar pela separação das águas entre política e justiça - conhecedor, como sou, de santos que cometem deslizes, e canalhas inocentes em casos concretos, não aprecio os julgamentos de carácter por telejornal, mais próprios das idas épocas dos pelourinhos e não de sociedades civilizadas com tribunais imparciais.
Do que ouvi, concluo que o juiz de instrução Ivo Rosa fez um trabalho inteligente de análise cuidada do processo, tendo concluído que José Sócrates foi corrompido, lavou dinheiro e falsificou documentos. Talvez por ser madeirense, o juiz utilizou uma técnica transatlântica bem conhecida, utilizada já com Al Capone: na impossibilidade de poder provar a mafiosidade, assentou a acusação sobre a lavandaria, e leva-o a julgamento por aquilo que o próprio José Sócrates admite: que recebeu mais de um milhão de euros do seu amigo que, aparentemente, recebeu o dinheiro dos putativos corruptores.
O tolo do meio da ponte de Amarante de Teixeira de Pascoais, não era juiz.
Luis Miguel Novais