Riqueza, civilização e prosperidade nacional

terça-feira, 8 de abril de 2025

O Pai de Eça

Há uns anos, em convalescença, li a obra completa de Eça de Queirós (ou Queiroz, na grafia do tempo dele), que um avô da Isabel tinha subscrito e veio assim parar à biblioteca de nossa casa. No final dos dez volumes, vêm publicadas umas cartas do pai de Eça, que era Juiz de Direito em Lisboa, a interceder junto de editores da capital para que publicassem a obra do filho. Ocorreu-me isto ao acabar de ler um texto de João Miguel Tavares, publicado no jornal Público de hoje, intitulado "Em defesa da honra do primeiro-ministro José Sócrates".

Penso que João Miguel Tavares e Ricardo Araújo Pereira rivalizam em mordacidade no espaço público (antes impresso, hoje teledirigido) com essa antecedente dupla notável Eça de Queirós e Camilo Castelo Branco. Depois de ler a obra literária (sei lá se completamente) de ambos estes últimos, opto por Camilo (mais erudito e prolífico, mais ao meu estilo polímato); da tal compilação de Eça ficaram-me os Maias, o Padre Amaro e o Mandarim - o resto, pareceram-me esboços e repetições. E as cartas, que são do pai, e constituem uma suprema ironia: não havia quem quisesse editar este génio... sem a cunha (ou pistolão) do importante pai.

A minha filha Marta padece do problema inverso. Para não me vir a arrepender mais tarde, o seu génio não beneficia do meu pistolão ou cunha de independente (sem quebra de humildade, naturalmente menos influente do que o pai de Eça). Perdemos todos, bem sei. Mas, como recorda João Miguel Tavares, neste Portugal adormecido ainda vigora a máxima maçónica (por ele atribuída ao inefável António Almeida Santos): "Para os amigos tudo, para os inimigos nada, aos outros aplique-se a lei".

Há 38 anos e mais uns dias que, praticamente todos os dias da minha vida, combato nos tribunais para que se aplique a lei a todos por igual. Tarefa hercúlea, bem sei, sem cunha ou pistolão. É a vida.

Luis Miguel Novais

P.S. José Sócrates sabe que merece condenação por factos censuráveis que não sou eu o único que conhece. Como dizia um velho ditado da língua portuguesa, hoje em desuso: "a verdade não tem pés, mas caminha".