Estes terríveis incêndios na floresta deste Portugal adormecido, que se repetem todos os anos pelo verão, não são exclusivamente acto da natureza, nem exclusivamente acto de criminosos; são também, essencialmente, um acto de má governação.
O melhor exemplo que encontro para ilustrar a possibilidade de governar bem a floresta é o do Pinhal de Leiria. Que se saiba, ainda não ardeu violentamente. E tem uns bons séculos de idade. Apesar dos riscos a que sempre esteve submetido, tem sobrevivido sem grandes incêndios. Como? Através de diversos actos de governação. E que não vêm de agora (se calhar pelo contrário, está em maior risco agora, a avaliar pelas vigias ao abandono que lá encontrei no ano passado).
Um desses actos de boa governação (de que tomei conhecimento aquando da investigação para o meu próximo livro e aqui partilho), é o do Regimento do Guarda Mor do Pinhal de Leiria, de 1751, do Marquês de Pombal. Aí se definem as obrigações dos diversos intervenientes no pinhal, desde o Guarda Mor (cuja designação me parece auto-explicativa das respectivas funções) até às dos diversos funcionários públicos que intervinham na manutenção (da limpeza à contabilidade, passando pela vigilância e etc.) e reparação (da substituição à replantação) da floresta.
Um problema que já não é novo, portanto. O mal, como o risco de grandes incêndios, existe sempre. Não há maneira de exterminá-lo. Mas há maneira de geri-lo, mitigá-lo. A isso chama-se governação. E corresponde a uma necessidade evidente, considerando que cerca de um terço do território nacional é coberto por floresta e há mortes a lamentar.
Fazer o trabalho de casa é, também, observar o que funciona, para depois aplicar a receita àquilo que não funciona. O Regimento do Guarda Mor do Pinhal de Leiria de 1751 é, por isso, de leitura obrigatória para os nossos governantes neste (mais este) trágico verão. A solução existe, há que aplicá-la.
Luis Miguel Novais
P.S. de 16.08.2016: texto republicado na edição de 14.08.2016 do jornal Diário de Notícias
Riqueza, civilização e prosperidade nacional